"Ir à biblioteca é como ir a um funeral", de Miguel Santos
O jornal Hermes, hoje traz-te um texto poético de Miguel Santos, aluno do 1° ano do curso de Jornalismo.

Ir à biblioteca é como ir a um funeral. A grande diferença, essa, é no motivo pelo qual se faz tanto silêncio. Num funeral, o silêncio revela respeito pela morte eterna. Numa biblioteca, o silêncio respeita a vida eterna. Há vida em todos os livros que nos rodeiam. Eu gosto disso. Gosto que se tenha tanto respeito pela morte como pela vida. Gosto que se respeite tanto o fim de tantas ideias como o começo de tantas outras. Gosto disso, mas silenciosamente, porque estou na biblioteca e se falar num tom normal parece que grito como um louco. É que tenho tanta gente à minha volta... e nenhuma fala comigo. Tantos conhecimentos que não tenho que me confortam, tantas incógnitas que me fazem companhia, tudo infindáveis histórias que jazem num antro coeso e discreto da prateleira. E cada livro é um funeral que faço a mim, é também uma pessoa numa cerimónia de luto como um tesouro calado de histórias impossíveis de numerar. Não. Não posso fazer barulho. Apenas sussurro para mim esta admiração pelo silêncio de um lugar cheio de objetos sem vida tão vivo e real.
- Miguel Santos